DURA LEX SECA LEX: A LEI É DURA, MAS É SECA!
Não se pode negar o caos no trânsito brasileiro, verdadeira guerra que ceifa 35 mil vidas por ano, 400 mil feridos em cerca de 1,5 milhão de acidentes, gerando um custo para o Estado de cerca de 22 bilhões de reais. Agora também não se pode negar que a Lei 11705/2008 que alterou o Código Brasileiro de Transito (CBT) é uma afronta ao Estado democrático e ofende os conhecimentos até de um estudante de 1º período do curso de direito.
È a velha mania brasileira de resolver velhos problemas com novas leis.
Quando um cidadão que bebe 2 taças de vinho pode ser preso, pagar uma multa de R$ 955,00, perder a CNH e ser condenado a prisão (6 meses a 3 anos), alguma coisa está errada.
Da noite para o dia, milhões de brasileiros conscientes e trabalhadores que se reúnem com amigos depois do trabalho para um ou dois chopes, que brindam uma conquista com uma taça de champanhe, que bebem umas taças de vinho com a namorada, que tomam uma cervejinha na churrascaria acompanhando um bom almoço, que adoram uma taça de sorvete com licor de cassis, se tornaram meliantes, perigosos assassinos, verdadeiro “serial killer” das estradas. Nem o padre pode acabar de celebrar a missa (onde ingere vinho) e dirigir até sua casa.
No mesmo saco foram colocados os inconseqüentes que depois de “encherem a cara” de bebida, barbarizam pelas ruas, apostando “rachas”, desobedecendo sinais e normas circulação e os trabalhadores que bebem um chope depois de um estafante dia de trabalho (e aquele padre que celebrou a missa).
No mesmo saco foram colocados os inconseqüentes que depois de “encherem a cara” de bebida, barbarizam pelas ruas, apostando “rachas”, desobedecendo sinais e normas circulação e os trabalhadores que bebem um chope depois de um estafante dia de trabalho (e aquele padre que celebrou a missa).
A infração penal tem por fundamento o perigo concreto, não abstrato. Em todo crime exige-se uma ofensa (real) ao bem jurídico tutelado. Como entende o jurista Luiz Flavio Gomes em artigo no site Jus Navigandi: “Não há crime sem condução anormal. A prisão em flagrante de em dirige normalmente é um abuso patente...” Ou seja, quem dirige (com mais ou menos de seis decigramas de álcool), sem perturbar a segurança viária, não comete crime. O mesmo professor tem outra reflexão interessante: "Confiar no agravamento das sanções penais e supor que isso, por si só, possa diminuir o numero de mortes e acidentes no Brasil, equivale a irresponsabilidade do pai que não conversa sobre drogas com seus filhos, porque convicto de que o Estado, a polícia e o Direito Penal farão isso no lugar dele."
Cabe aqui uma analise jurídica da referida lei, pela nova lei o artigo 276 do Código de Transito Brasileiro (CTB), passa a ter a seguinte redação: “Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165 deste código.” E o que diz o artigo 165 do CTB?, o seguinte: “Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.” Clara contradição da lei, uma vez que o ultimo artigo deixa claro que só deve ser punido quem DIRIGE SOB A INFLUÊNCIA DO ALCOOL. Ou seja, não faz sentido punir quem tiver alguma concentração de álcool, mas estiver dirigindo regularmente, fora da famigerada INFLUÊNCIA DO ALCOOL. Os dois artigos do CTB estão brigando entre si.
Flagrante inconstitucionalidade contamina o artigo 277 § 3º quando reza que: “Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.” Atinge violentamente o inciso LXIII do art. 5º da Constituição, que determina que ninguém pode ser obrigado a fazer prova contra si mesmo.
Algumas pessoas estão recorrendo ao Poder Judiciário requerendo Habeas Corpus visando não serem obrigadas a submeter-se ao bafômetro ou outro teste, nem tampouco serem penalizados por tal negativa. E estão conseguindo. Atendendo a um pedido, o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu salvo-conduto ao requerente, determinando que o mesmo não é obrigado a submeter-se ao bafômetro, nem ser penalizado por esta recusa. A decisão fundamenta: “Ora, não se podem dizer adequadas, necessárias e proporcionais aquelas penalidades em relação ao motorista que seja surpreendido com qualquer concentração de álcool por litro de sangue (art. 276, caput). Estarão sujeitos, a mesma pena, nos termos da legislação em causa, tanto os motoristas que forem surpreendidos dirigindo completamente embriagados, como aqueles que tiverem ingerido pequena dose, com o perfeito domínio de seus reflexos, sem representar qualquer perigo ao trânsito. Não se está a negar a necessidade de severa punição aos motoristas que dirigem embriagados. Mas daí a punir, também com severidade, quem dirige após ingerir um copo de cerveja, ou um copo de vinho, exemplificativamente, vai uma larga distância. Os jornais, as rádios e os canais de televisão têm mostrado os absurdos que estão sendo cometidos, com a detenção de motoristas que, embora com alguma concentração de álcool por litro de sangue, não se podem dizer embriagados. Esse fato, por si só, caracteriza o justo receio que acomete o impetrante, e justifica a concessão da liminar.” (HC 801049.5/1- Marcio Franklin Nogueira – Desembargador.).
A queda nos números de acidentes e mortes nos últimos dias é resultado de uma intensa fiscalização dos agentes públicos, não resultado da lei mais rigorosa. Pois o que reduz os crimes é a ação eficiente do Estado na punição. O mesmo fato ocorreu quando da implantação do Codigo de Trânsito, em 1998. Na epóca os acidentes cairam cerca de 25% no primeiro ano e depois voltaram a subir.
Já que estamos falando em estatísticas, notamos que a taxa de homicidio na capital paulista diminuiu em 29,5% de 2006 para 2007 (O globo on line 06/08/08) e não tivemos nenhuma lei nova aumentando as penas para tal crime. Houve apenas o endurecimento na repressão ao crime.
A solução para a tragédia do transito é esta: um Estado bem aparelhado, eficiente, com servidores motivados e bem remunerados, via urbanas e rodovias bem conservadas e uma forte ação de conscientização e educação desde os primeiros anos na escola. Se leis draconianas fossem a solução, não teríamos no Brasil, tantos homicídios e este intenso tráfico de drogas. O que estimula o crime é a impunidade.
Cabe aos brasileiros ficarem alertas quanto a restrições de direitos, pois daqui a pouco estarão falando em proibição de bebidas em eventos (shows, bailes, rodeios, feiras, etc.), toque de recolher e outras medidas fundamentalistas.
È sempre bom recordar o poema de Eduardo Alves da Costa (No caminho com Maiakovski):
“Na primeira noite, eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim.
“Na primeira noite, eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem, pisam as flores, matam nosso cão.
E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles, entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.”
Comentários
Seu texto está muito bem detalhado, parabéns.
ordem do sistema é: Cria o cáos para poder oferecer a ordem! Dita com mão de ferro o que é melhor “para todos”, desestabiliza para prometer o ajuste! Esses são os pilares de uma ditadura civil como a que, disfarçadamente, se apodera do planalto. Enquanto isso vamos apludir moçada… Viva a nova lei… Viva a perda dos Direitos Individuais em função da ordem social..! Ah, em tempo: As reportagens "esqueceram" de mostrar ao Brasil o enteado de um conhecido senador do governo (PT), caíndo em uma blitz visivelmente bêbado, e identificando-se ao agênte, foi imediatamente solto com um tapinha nas costas. Sabe como é, a Lei é igual para todos só que para alguns ela é mais igual do que para outros. Parabens pelo Blog e a postagem!