DO CAPITAL AO SOCIAL
RESPONSABILIDADE SOCIAL: DEVER OU LIBERALIDADE?
“Retirar o capital, os bens de produção do estado de ócio (aspecto estático), consiste, pois, em utilizá-los em qualquer empresa proveitosa a si mesma e à comunidade. É dinamizá-los para produzirem novas riquezas, gerando empregos e sustento aos cooperadores da empresa e à comunidade. É substituir o dever individual, religioso, de dar esmola pelo dever jurídico inspirado no compromisso com a comunidade, de proporcionar-lhe trabalho útil e adequadamente remunerado” IZABEL VAZ (Direito Econômico da Propriedade. 2ª ed. Forense, 1993).
A expressão RESPONSABILIDADE SOCIAL é interpretada de diversas formas pelas empresas. Algumas entendem que RS resume-se ao cumprimento da finalidade institucional da sociedade empresária: Lucro aos acionistas + salários aos funcionários + impostos ao governo. Outras empresas, além deste tripé básico, contribuem com obras e programas sociais, sem se envolver com a gestão destas atividades. Finalmente temos aquelas que investem em grandes programas sociais, visando o desenvolvimento humano, social, ambiental e econômico.
Mas a pergunta não quer calar: RESPONSABILIDADE SOCIAL é liberalidade? È dever cristão? É obrigação legal?
A discussão é muito mais profunda. Abrange o próprio instituto da propriedade e sua função social.
O artigo 5° da Constituição Federal que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos estabelece em seu inciso XXII que é garantido o direito de propriedade. O inciso seguinte estabelece a condição para a garantia deste instituto: a propriedade atenderá a sua função social. No artigo 170 inciso III, tal função social é colocada entre os princípios gerais da atividade econômica. Nos incisos deste artigo são listados os seguintes princípios: soberania nacional, propriedade privada, função social da propriedade, livre concorrência, defesa do consumidor, defesa do meio-ambiente, redução das desigualdades regionais e sociais, busca do pleno emprego e tratamento favorecido para as pequenas empresas.
Com base neste artigo fica fácil visualizar uma empresa que cumpre sua constitucional função social: é aquela que cumpre sua missão empresarial (dar lucro aos acionistas), garantindo satisfação do consumidor, preservação do meio ambiente,geração de empregos e participando do desenvolvimento social do meio em que está inserida.
O Código Civil em seu art. 2035, parágrafo único, estabelece que: “nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos neste Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.” Tal disposição legal invalida todo negócio que ferir o principio da função social da propriedade.
Não foi o novo Código Civil que inaugurou no ordenamento jurídico brasileiro, a função social da empresa, a Lei 6.404/76 (Dispõe sobre as sociedades por ações), o parágrafo único do artigo 116 estabelece: “O acionista controlador de vê usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social” e mais adiante no artigo 154 dita: “O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa.”
Como se vê FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE e RESPONSABILIDADE SOCIAL não são questões de mera liberalidade, trata-se de dever legal.
"É necessário recordar mais uma vez o princípio típico da doutrina social cristã: os bens deste mundo são originariamente destinados a todos. O direito à propriedade privada é válido e necessário, mas não anula o valor de tal princípio. Sobre a propriedade, de facto, grava ‘uma hipoteca social’, quer dizer, nela é reconhecida, como qualidade intrínseca, uma função social, fundada e justificada precisamente pelo princípio da destinação universal dos bens.” (Papa JOÃO PAULO II - encíclica Solliciutto Rei Socialis, 1987).
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